Pense comigo: daqui a 150 anos, nenhum de nós, nem eu que escrevo nem você que lê agora estas palavras, estará presente. Esta simples constatação, embora óbvia, carrega um peso existencial que muitas vezes ignoramos porque não queremos pensar no fim das coisas ou no fim da vida. A efemeridade da vida, tema central da filosofia estóica, ecoa em cada aspecto do nosso caminho, desde as conquistas materiais até os relacionamentos que cultivamos. Para quê tanto peso sobre a maioria das coisas no dia-a-dia, quando, mais tarde, percebemos que tudo não precisava ter sido tão pesado como foi se fossemos todos mais leves e flexíveis.
Tudo à nossa volta e tudo o que temos e nos cerca está na nossa vida, mas nada seguirá connosco quando tudo acabar. Bens materiais, poder, dinheiro e até mesmo a fama, tão procurada de forma inútil na maioria na nossa sociedade, perdem sua relevância diante da inevitabilidade da morte. A psicologia evolutiva ajuda-nos a entender esta busca incessante por status e recursos, enraizada em nossos instintos de sobrevivência e reprodução. No entanto, no mundo moderno TUNA (turbulent, uncertain, novelty e ambiguous), onde a abundância material é uma realidade para muitos em crescendo, e de inspiração de terceiros desconhecidos nas redes sociais, mostra-nos que essa busca pode tornar-se uma armadilha, levando a comportamentos autodestrutivos e relações tóxicas, a medir o valor individual por audiência e comparação, a achar que o que é dos outros deveria ser meu.
A psicoterapia interpessoal (um dos modelos científicos validados mais eficazes para o tratamento das perturbações de humor), por sua vez, lembra-nos da importância fundamental das relações interpessoais. Os nossos relacionamentos moldam o nosso bem-estar emocional e oferecem-nos um senso de pertença e significado. A pessoa ou pessoas que escolhemos ou temos mais perto com frequência é quem mais nos afunda ou expande. Esquecer isto é ignorar quem nos vai impedir de viver ou viver junto a acrescentar valor à vida. Cultivar relações saudáveis, baseadas no amor, na empatia e na reciprocidade com comunicação irrepreensível sem tabus de limitações morais ou impostas por terceiros, é essencial para uma vida plena. Muito difícil mas possível quando suportamos o caminho.
O estoicismo, com a sua sabedoria milenar, convida-nos a aceitar a impermanência da vida e a focar energia e expectativas no que podemos controlar: as nossas ações e atitudes. Em vez de nos apegarmos a bens materiais ou à busca por validação externa, devemos cultivar virtudes como a coragem, a justiça, a temperança/ equilíbrio e sabedoria. E o que acontece no mundo onde não temos poder de agir ou influenciar (desde guerras e conflitos internacionais ou sobre quintal ou carro novo do vizinho), devemos sempre nos perguntar se vale a pena tanta informação para preocupar com o que não conseguimos mudar. Neste sentido, enquanto o mundo que não controlamos acontece, sugiro sempre pipocas mistas que são melhores do que apenas doces ou salgadas. Mas isso digo eu.
O “memento mori” dos estóicos, que se refere à prática de lembrar da nossa própria mortalidade, ajuda-nos a priorizar o que realmente importa. Ao reconhecer a fragilidade da vida, somos incentivados a viver de forma mais consciente e significativa, apreciando cada momento e cultivando relações autênticas. O que os outros pensam, é problema deles, não é meu.
Diante da efemeridade da existência, a busca por significado torna-se uma jornada essencial que devemos fazer, cada um por si, como desenvolvimento pessoal. A psicologia, a psicoterapia interpessoal e o estoicismo oferecem-nos ferramentas valiosas para fazer este caminho. Junte-se a pessoas que o façam sentir parte de uma comunidade de gente autêntica, que sabe conviver com as suas diferenças. Há clubes sociais que facilitam isso, quer online, quer presenciais (ex. Clube dos Estóicos). Ao cultivar relações saudáveis, focar no que podemos controlar e apreciar o presente (“carpe diem”), podemos construir uma vida mais plena e significativa, graças à inevitável mortalidade.
Por isso é que a vida vale a pena ser vivida hoje, porque amanhã, não sabemos se estamos por cá.
Ivandro Soares Monteiro
Artigo publicado no jornal da diáspora portuguesa BOM DIA: